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POLÍTICA - Bem comum ou exercício do poder?

      O que é política? Comecemos nossa investigação buscando o significado básico dessa palavra. O termo política vem do grego politeía (que, por sua vez, deriva de polis, "cidade-Estado") e designa, desde a Antiguidade, o campo da atividade humana que se refere à cidade, ao Estado, à administração pública e ao conjunto dos cidadãos. Refere-se, portanto, a uma área específica das relações existentes entre os indivíduos de uma sociedade.
      Desse modo, se queremos entender o fenômeno político, devemos começar por estudar as características que o distinguem dos demais fenômenos sociais e analisar as instituições e as práticas das sociedades políticas existentes. Depois, poderemos também conjeturar sobre a melhor maneira de construir politicamente as sociedades futuras.
      Foi a isso que se dedicou boa parte dos filósofos, constituindo o campo de reflexão conhecido como filosofia política. Integram a temática básica da filosofia política as investigações em torno do poder, do Estado, dos regimes políticos e formas de governo, além das questões sobre a participação dos cidadãos na vida pública e a liberdade política, entre outras. Veremos a seguir um pouco disso tudo.


Conceitos de política
    A obra Política de Aristóteles é considerada um dos primeiros tratados sistemáticos sobre a arte e a ciência de governar a pólis e, portanto, da filosofia política. Foi devido, em grande medida, a essa obra clássica que o termo política se firmou nas línguas ocidentais.
      Para Aristóteles, a política era uma "continuação" da ética, só que aplicada à vida pública. Assim, depois de refletir, em Ética a Nicômaco, sobre o modo de vida que conduz à felicidade humana, investigou em Política às instituições públicas e as formas de governo capazes de propiciar uma maneira melhor de viver em sociedade. O filósofo considerava essa investigação fundamental, pois, para ele, a cidade (a pólis) constitui uma criação natural e o ser humano também é, por natureza, um animal social e político.
      O conceito grego de política como esfera de realização do bem comum tornou-se clássico e permanece até nossos dias, mesmo que seja como um ideal a ser alcançado.
      Por sua vez, o conceito moderno de política — conforme assinalou o filósofo político italiano Norberto Bobbio (1909-2004) — está estreitamente ligado ao de poder. Essa ligação é enfatizada na célebre definição dada pelos cientistas políticos Harold Dwight Lasswell e Abraham Kaplan em sua obra Poder e sociedade, segundo a qual a política é o processo de formação, distribuição e exercício do poder.
      Sendo o poder um tema central da discussão política moderna e contemporânea, os estudos nessa área geralmente iniciam com uma análise do fenômeno do poder.


Fenômeno do poder
    O que é poder? A palavra poder vem do latim potere, posse, "poder, ser capaz de". Refere-se fundamentalmente à faculdade, capacidade, força ou recurso para produzir certos efeitos. Assim, dizemos: o poder da palavra, o poder do remédio, o poder da política, o poder da imprensa, o poder do presidente.
      Talvez com base no sentido etimológico da palavra, o filósofo inglês Bertrand Russell (1872-1970) definiu o poder como a capacidade de fazer que os demais realizem aquilo que queremos. Assim, o indivíduo que detém essa capacidade — ou meios — tem a faculdade de exercer determinada influência ou domínio sobre outro e, por seu intermédio, alcançar os efeitos que desejar.
      O fenômeno do poder costuma ser dividido em duas categorias: o poder do ser humano sobre a natureza e o poder do ser humano sobre outros seres humanos. Frequentemente, essas duas categorias de poder estão juntas e se complementam.
      A filosofia política investiga o poder do ser humano sobre outros seres humanos, isto é, o poder social, embora também se interesse pelo poder sobre a natureza, uma vez que essa categoria de domínio igualmente se transforma em instrumento de poder social.


Formas de poder
    Assim, voltando à definição de poder, se levarmos em conta o meio do qual se serve o indivíduo para conseguir os efeitos desejados, podemos destacar três formas básicas de poder social, conforme a análise de Norberto Bobbio:
poder econômico — é aquele que utiliza a posse de certos bens socialmente necessários para induzir o que não os possuem a adotar determinados comportamentos, por exemplos, realizar determinado trabalho;
poder ideológico — é aquele que utiliza a posse de certas ideias, valores, doutrinas para influenciar a conduta alheia, induzindo as pessoas a determinados modos de pensar e agir;
poder político — é aquele que utiliza a posse dos meios de coerção social, isto é, o uso da força física considerada legal ou autorizada pelo direito vigente na sociedade.
      O que essas três formas de poder têm em comum?

"[...] elas contribuem conjuntamente para instituir e manter sociedades de desiguais divididas em fortes e fracos, com base no poder político; em ricos e pobres, com base no poder econômico; em sábios e ignorantes, com base no poder ideológico. Genericamente, em superiores e inferiores." (Bobbio, Estado, governo, sociedade, p. 83).

      O poder econômico preocupa-se em garantir o domínio da riqueza controlando a organização das forças produtivas (por exemplo: o tipo de produção e o alcance de consumo das mercadorias). O poder ideológico preocupa-se em garantir o domínio sobre o saber controlando a organização do consenso social (por exemplo: os meios de comunicação de massa — televisão, jornais, rádios, revistas etc.) O poder político preocupa-se em garantir o domínio da força institucional e jurídica controlando os instrumentos de coerção social (por exemplo: forças armadas, órgãos de fiscalização, política, tribunais etc.).
      Desses três poderes (econômico, político e ideológico), qual seria o principal, o mais eficaz? Para Bobbio, é o poder político, cujo meio específico de atuação consiste na possibilidade de utilizar a força física legalizada para condicionar comportamentos. Assim,

"[...] o poder político é, em toda sociedade de desiguais, o poder supremo, ou seja, o poder ao qual todos os demais estão de algum modo subordinados." (Bobbio e outros, Dicionário de política, p. 995-996).

      Bobbio desenvolve o argumento de que o poder econômico é fundamental para que o mais rico subordine o mais pobre, assim como o poder ideológico é necessário para conquistar a adesão da maioria das pessoas aos valores do grupo dominante. No entanto, só o uso do poder político, da força física, serve, em casos extremos, para impedir a insubordinação ou desobediência dos subordinados. E nas relações entre dois ou mais grupos poderosos, em termos econômicos ou ideológicos, o instrumento decisivo na imposição da vontade é a guerra, que consiste no recurso extremo do poder político.

Guernica (1937) — Pablo Picasso. Em uma demonstração de poder, aviões nazistas aliados ao ditador espanhol Franco bombardearam, em 26 de abril de 1937, o povoado de Biscaia, no vale de Guernica, Espanha. Era dia de feira livre e a praça estava cheia. Mais de 1600 pessoas morreram e centenas ficaram feridas.

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