primeira grande característica de Aristóteles está em que, quase sem predecessores, quase que inteiramente graças ao seu raciocínio consistente, ele criou uma nova ciência ― a lógica. Renan (History of the People of Israel, vol. V, p. 338) fala do "treinamento defeituoso da mente que não tenha sofrido, direta ou indiretamente, os efeitos da disciplina grega"; na verdade, porém, a inteligência grega era indisciplinada e caótica até que as fórmulas implacáveis de Aristóteles proporcionaram um método rápido para o teste e a correção do pensamento. Até mesmo Platão (se um admirador pode presumir a tal ponto) era uma alma indisciplinada e irregular, envolto com demasiada frequência numa nuvem de mito e deixado que a beleza velasse com excessiva suntuosidade a face da verdade. O próprio Aristóteles, como iremos ver, violava profusamente seus próprios cânones; mas acontece que ele era o produto de seu passado, não do futuro que seu pensamento iria construir. A decadência política e econômica da Grécia provocou um enfraquecimento da mentalidade e do caráter helênicos depois de Aristóteles; mas quando uma nova raça, após um milênio de bárbara escuridão, foi o "Organon" da lógica de Aristóteles, traduzido por Boécio (40-525 a.C.), que se tornou o modelo do pensamento medieval, a mãe rigorosa da filosofia escolástica que, embora tornada estéril pelos dogmas que a cercavam, treinou o intelecto da Europa adolescente para o raciocínio e a sutileza, construiu a terminologia da ciência moderna e lançou as bases daquela mesma maturidade de mentalidade que iria sobrepujar e derrubar o sistema e os métodos que lhe haviam dado origem e sustento.
Lógica significa, simplesmente, a arte e o método do pensamento correto. É a logia ou método de toda ciência, de toda disciplina e de todas as artes; e até a música a contém. É uma ciência porque, numa proporção muitíssimo elevada, os processos de pensamento correto podem ser reduzidos a regras como a física e a geometria, e ensinados a qualquer inteligência normal; é uma arte, porque, pela prática, dá ao pensamento, afinal, aquela precisão inconsciente e imediata que guia os dedos do pianista sobre o seu instrumento para extrair harmonias sem esforço. Nada é tão enfadonho quanto a lógica, e nada tão importante.
Havia vestígios dessa nova ciência na enfurecedora insistência de Sócrates com relação a definições, e no constante refinamento de cada conceito por parte de Platão. O pequeno tratado de Aristóteles sobre Definições mostra como a sua lógica se alimentava naquela fonte. "Se quiser conversar comigo", diz Voltaire, "defina seus termos." Quantos não seriam os debates que teriam ficado reduzidos a um parágrafo se os contendores tivessem tido a ousadia de definir seus termos! O alfa e o ômega da lógica, seu coração e sua alma, estão em que termo importante num discurso sério deve ser submetido, com o maior rigor, ao escrutínio e à definição. É difícil, e representa um teste impiedoso para a mente; uma vez feito, porém, representa a metade de qualquer tarefa.
De que modo iremos definir um objeto ou um termo? Aristóteles responde que toda boa definição tem duas partes, afirma-se sobre dois sólidos pés: primeiro encaixa o objeto em questão numa classe ou grupo cujas características gerais são também as dele ― assim, o homem é, antes de tudo, um animal; segundo, indica os pontos em que o objeto difere de todos os outros membros de sua classe ― por isso, o homem, no sistema aristotélico, é um animal racional; sua "diferença específica" é que, ao contrário de todos os outros animais, ele é racional (eis a origem de uma boa lenda). Aristóteles deixa um objeto cair no oceano de sua classe e depois o retira todo gotejante de significado genérico, com as marcas da sua espécie e de seu grupo; enquanto sua individualidade e sua diferença brilham de forma ainda mais nítida como resultado dessa justaposição com outros objetos que a ele tanto se assemelham e que são muito diferentes.
Deixando essa retaguarda da lógica, entramos no grande campo de batalha no qual Aristóteles decidiu com Platão a terrível questão dos "universais"; foi o primeiro conflito numa guerra que iria durar até os nossos tempos e fazer com que a Europa medieval vibrasse com o entre-choque de "realistas" e "nominalistas". (Foi referindo-se a esse debate que Friedrich Schlege disse: "Todo homem nasce platônico ou aristotélico". Um universal, para Aristóteles, é qualquer substantivo comum, qualquer nome capaz de uma aplicação universal aos membros de uma classe: assim, animal, homem, livro, árvore são universais. Mas esses universais são ideias subjetivas, não tangíveis, realidades objetivas; são nomina (nomes) não res (coisas); tudo o que existe fora de nós é um mundo de objetos individuais e específicos, não de coisas genéricas e universais; os homens existem, e também as árvores e os animais; mas o homem em geral, ou o homem universal, não existe, exceto em pensamento; ele é uma abstração mental prática, não uma presença externa ou realidade.
Ora, Aristóteles entende que Platão afirmou que os universais têm uma existência objetiva; e realmente Platão dissera que o universal é incomparavelmente mais duradouro, importante e substancial do que o individual ― com este último não passando de uma marola em um interminável quebrar de ondas; os homens vêm e se vão, mas o homem é eterno. A mente de Aristóteles é prática; como diria William James, uma mente rija, não macia; ele vê a raiz do misticismo interminável e do absurdo erudito nesse "realismo" platônico; e a combate com todo o vigor de uma primeira polêmica. Assim como Brutus não amava César menos, mas amava mais a Roma, Aristóteles diz: Amicus Plato, sed magis amica veritas ― "Querido é Platão, mas ainda mais querida é a verdade".
Algum comentarista hostil poderia observar que Aristóteles (como Nietzsche) critica Platão com tanta veemência porque está consciente da maneira generosa com que dele tomou por empréstimo; nenhum homem é um herói para seus devedores. Mas, apesar de tudo, Aristóteles tem uma atitude saudável; ele é um realista quase que no sentido moderno; está decidido a se preocupar com o presente objetivo, enquanto Platão está absorvido em um futuro subjetivo. Havia, na procura socrática-platônica por definições, uma tendência a se afastar das coisas e dos fatos para as teorias e as ideias, dos particulares para as generalidades, da ciência para a escolástica; por fim, Platão se tornou tão dedicado às generalidades que elas começaram a determinar seus particulares, tão dedicado às ideias que elas começaram a definir ou selecionar seus fatos. Aristóteles prega um retorno às coisas à "face imarcescível da natureza" e à realidade; ele tinha uma forte preferência pelo particular concreto, pelo indivíduo de carne e osso. Mas Platão amava tanto o geral e o universal, que em A República destruiu o indivíduo para formar um Estado perfeito.
No entanto, com o usual humor da história, o jovem guerreiro assume muitas das qualidades do velho mestre que ele ataca. Sempre temos em nós um grande estoque daquilo que condenamos: como apenas os semelhantes podem ser contrastados com vantagem, só as pessoas semelhantes discutem, e as guerras mais violentas têm como motivo as ligeiras variações de propósito ou crença. Os cavaleiros cruzados encontraram em Saladino um cavalheiro com quem podiam discutir amigavelmente; mas quando os cristãos da Europa invadiam acampamentos hostis; não havia quartel nem mesmo para o mais cortês dos inimigos. Aristóteles é tão implacável com Platão porque existe muito de Platão nele; também ele continua um amante de abstrações e generalidades, traindo repetidas vezes o fato simples por alguma teoria ilusoriamente enfeitada, e compelido a uma luta contínua para conquistar sua paixão filosófica por explorar o empíreo.
Há um forte traço disso nas mais características e original das contribuições de Aristóteles para a filosofia ― a doutrina do silogismo. Um silogismo é um trio de proposições das quais a terceira (a conclusão) segue-se da verdade admitida das outras duas (as premissas "maior" e "menor"). Por exemplo, o homem é um animal racional; mas Sócrates é homem; portanto, Sócrates é um animal racional. O leitor que goste de matemática perceberá, de imediato, que a estrutura do silogismo assemelha-se à proposição de que duas coisas iguais à mesma coisa são iguais entre si. Se A é B, e C é A, então C é B. Como no caso matemático, chega-se à conclusão cancelando de ambas as premissas o termo comum às duas, A; assim, no nosso silogismo chega-se à conclusão cancelando as duas premissas o seu termo comum "homem" e combinando o que restar. A dificuldade, como salientaram os lógicos da época de Pirro até a de Stuart Mill, está em que a principal premissa do silogismo aceita como ponto pacífico precisamente o detalhe a ser provado; porque, se Sócrates não for racional (e ninguém questiona o fato de ele ser homem), não será universalmente verdadeiro que o homem é um animal racional. Aristóteles retrucaria, sem dúvida, que quando se verifica que um indivíduo possui um grande número de qualidades características de uma classe ("Sócrates é um homem"), cria-se uma forte presunção de que o indivíduo possui as outras qualidades características dessa classe ("racionalidade"). Parece, porém, que o silogismo não é tanto um mecanismo para a descoberta da verdade quanto para a clareza de exposição e de pensamento.
Tudo isso, como os outros itens do "Organon", tem o seu valor: "Aristóteles descobriu e formulou todos os cânones da consistência teórica e todos os artifícios do debate dialético, com uma diligência e uma perspicácia para as quais não há elogios que cheguem; e seus trabalhos nessa direção talvez tenham contribuído, mais do que o de qualquer outro escritor, para o estímulo intelectual de gerações posteriores." Mas nunca existiu um homem que pudesse elevar a lógica a uma classe eminente: um guia para o raciocínio correto é tão enobrecedor quanto um manual de etiqueta; podemos usá-lo, mas dificilmente ele nos impelirá para a nobreza. Nem mesmo o mais arrojado dos filósofos teceria-lo-as a um livro de lógica. Sempre nos sentimos, em relação à lógica, como Virgílio mandou que Dante se sentisse em relação àqueles que tinham sido condenados por sua neutralidade incolor: Non ragionan di lor, ma guarda e passa (Inferno, III, 60). ― "Não pensemos mais neles, mas olhe uma vez e siga em frente".
A História da Filosofia, de Will Durant
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