Não foi difícil o instrutor do rei dos reis conseguir alunos, mesmo na hostil cidade de Atenas. Quando, aos 53 anos de idade, Aristóteles fundou sua escola, o Liceu, foram tantos os alunos que acorreram que se tornou necessário estabelecer regras complicadas para manter a ordem. Os próprios estudantes determinaram as regras e elegiam, a cada dez dias, um deles para supervisionar a Escola. Mas não devemos pensar que ela fosse um lugar de disciplina rígida; ao contrário, o retrato que chega até nós é de estudantes fazendo refeições em comum com o mestre e aprendendo com ele enquanto passeavam de uma ponta a outra da Alameda que acompanhava o campo de atletismo e da qual o Liceu derivou o seu nome. (A Alameda se chamava Perípatos; daí o nome surgido mais tarde, Escola Peripatética. O campo de atletismo fazia parte da área do templo de Apoio Liceu ― o protetor do rebanho contra o lobo). A nova Escola não era uma simples réplica daquela que Platão havia deixado. A Academia se dedicava, acima de tudo, à matemática e à filosofia especulativa e política; o Liceu tinha, mais, uma tendência para a biologia e as ciências naturais. Se pudermos acreditar em Plínio (Hist. Nat., VIII, 16; em Lewes, Aristotle, a Chapter from the History of Science, Londres, 1864, p. 15). Alexandre dera instruções a seus caçadores, coureiros, jardineiros e pescadores para que fornecessem a Aristóteles todo o material zoológico e botânico que pudesse desejar; outros autores antigos nos dizem que, certa vez, ele teve à sua disposição mil homens espalhados pela Grécia e pela Ásia, recolhendo para ele espécimes da fauna e da flora de todos os países. Com essa abundância de material, ele pôde criar o primeiro grande jardim zoológico que o mundo até então já vira. Nunca é demais salientar a influência dessa coleção sobre a sua ciência e sua filosofia.
Onde Aristóteles conseguia os fundos para financiar tais empreendimentos? Ele mesmo, àquela altura, era um homem de vultosos rendimentos; e pelo casamento passara a partilhar da fortuna de um dos mais poderosos homens públicos da Grécia. Ateneu (sem dúvida que com um certo exagero) relata que Alexandre deu a Aristóteles, para equipamentos e pesquisas físicas e biológicas, a soma de oitocentos talentos (poder aquisitivo atual, cerca de quatro milhões de dólares). Foi por sugestão de Aristóteles, segundo alguns, que Alexandre enviou uma dispendiosa expedição para explorar as fontes do Nilo e descobrir as causas de seu transbordamento periódico (A expedição relatou que as inundações eram devidas ao derretimento da neve nas montanhas da Abissínia). Trabalhos como o digesto de 158 constituições políticas, preparado para Aristóteles, indicam um considerável corpo de auxiliares e secretários. Em suma, temos aqui o primeiro exemplo, na história europeia, do financiamento em larga escala da ciência pelo erário público. Que conhecimento não obteríamos se os estados modernos apoiassem a pesquisa numa escala proporcionalmente generosa!
No entanto, iríamos cometer uma injustiça para com Aristóteles se fôssemos ignorar as limitações quase fatais do equipamento que acompanhava aqueles recursos e facilidades sem precedentes. Ele se via obrigado a "especificar a hora sem um relógio, comparar graus de calor sem um termômetro, observar o céu sem um telescópio e o tempo sem um barômetro. (...) De todos os nossos instrumentos matemáticos, ópticos e físicos, ele só possuía a régua e o compasso, juntamente com imperfeitíssimos substitutos de alguns dos outros. A análise química, as medidas e os pesos corretos, e uma completa aplicação da matemática à física, tudo isso era desconhecido. A força de atração da matéria, a lei da gravitação, os fenômenos elétricos, as condições das combinações químicas, a pressão do ar e seus efeitos, a natureza da luz, do calor, da combustão etc., em suma, todos os fatos em que se baseiam as teorias físicas da ciência moderna, estavam totalmente, ou quase totalmente, por descobrir." (Zeller, I, 264, 443).
Vejam, aqui, como as invenções fazem a história: por falta de um telescópio, a astronomia de Aristóteles é um amontoado de romance infantil; por falta de um microscópio, sua biologia entra por descaminhos intermináveis. De fato, foi na invenção industrial e técnica que a Grécia ficou muito atrás do padrão geral de suas realizações sem paralelo. O desdém grego pelo trabalho manual impedia que todos, exceto o escravo indiferente, tivessem um conhecimento direto do processo de produção, aquele estimulante contato com a maquinaria que revela defeitos e prefigura possibilidades; a invenção técnica só era possível para aqueles que não se interessavam por ela e não podiam obter dela qualquer recompensa material. Talvez a própria barateza dos escravos retardasse as invenções; os músculos ainda eram mais baratos do que as máquinas. E assim, enquanto o comércio grego conquistava o mar Mediterrâneo e a filosofia grega conquistava a mente mediterrânea, a ciência grega estava perdida e a indústria grega continuava quase que no ponto em que a indústria egeia estivera quando os gregos invasores haviam caído sobre ela em Canosso, Tirinto e Micenas, mil anos antes. Não há dúvida de que temos, aqui, o motivo pelo qual é tão raro Aristóteles apelar para o experimento; os mecanismos do experimento ainda não tinham sido criados; e o melhor que ele podia fazer era chegar a uma observação quase universal e contínua. Apesar de tudo, a imensa quantidade de dados reunidos por ele e seus assistentes tornou-se a base do progresso da ciência, o livro didático do conhecimento durante dois mil anos; uma das maravilhas do trabalho do homem.
Os trabalhos escritos de Aristóteles chegam às centenas. Certos autores antigos atribuem-lhe a autoria de quatrocentos volumes, outros de mil. O que resta é apenas uma parte, constituindo, no entanto, uma biblioteca completa ― imaginem a amplitude e a grandeza do todo. Primeiro, vêm os trabalhos sobre a lógica: Categorias, Tópicos, Primeira e Segunda Analítica, Proposições e Refutação dos Sofistas; eles foram reunidos e editados mais tarde pelos peripatéticos sob o título geral de "Organon" de Aristóteles ― isto é, o órgão ou o instrumento para o pensamento correto. Depois, vêm os trabalhos científicos: A Física, Sobre o Céu, Crescimento e Decadência, Meteorologia, História Natural, Sobre a Alma, As Partes dos Animais, Os Movimentos dos Animais e A Geração dos Animais. Em terceiro, vêm os trabalhos relativos à estética: Retórica e Poética. E, em quarto, os trabalhos mais estritamente filosóficos: Ética, Política e Metafísica. (Esta, tanto quanto se sabe, é a ordem cronológica).
Temos aqui, evidentemente, a Encyclopedia Britannica da Grécia: todos os problemas abaixo e ao redor do sol têm um lugar nela; não admira que existam mais erros e absurdos em Aristóteles do que em qualquer outro filósofo que tenha escrito alguma coisa. Aqui está uma síntese de conhecimento e teoria que nenhum homem tornaria a realizar até a época de Spencer, e mesmo então com uma magnificência que não chegava à metade dela; aqui, melhor do que a impulsiva e brutal vitória de Alexandre, estava uma conquista do mundo. Se a filosofia é a procurada unidade, Aristóteles merece o elevado título que vinte séculos lhe deram: Ille Philosophus: O Filósofo.
Naturalmente, a um espírito de tal pendor científico faltava a poesia. Não devemos esperar de Aristóteles o brilhantismo literário que inunda as páginas do filósofo-dramaturgo Platão. Em vez de nos dar uma alta literatura, na qual a filosofia esteja corporificada (e obscurecida) em mitos e imagens, Aristóteles nos dá ciência, técnica, abstrata, concentrada; se o formos procurar em busca de divertimento, iremos mover uma ação para ter nosso dinheiro de volta. Em vez de dar termos à literatura, como fez Platão, ele construiu a terminologia da ciência e da filosofia; praticamente não podemos falar de qualquer ciência, hoje, sem empregar termos que ele inventou; eles jazem como fósseis no substrato de nossa linguagem: faculdade, média, máxima (que significa, em Aristóteles, a principal premissa de um silogismo), categoria, energia, realidade, motivo, fim, princípio, forma ― estas indispensáveis moedas do pensamento filosófico foram cunhadas em sua mente. E talvez essa passagem de diálogo deleitável para o tratado científico preciso fosse um passo necessário na evolução da filosofia; e a ciência, que é a base e a espinha dorsal da filosofia, não podia crescer enquanto não desenvolvesse seus próprios métodos rigorosos de procedimento e expressão. Aristóteles também escreveu diálogos literários, de conceito tão alto, em sua época, quanto os de Platão; mas eles se perderam, assim como pereceram os tratados científicos de Platão. É provável que o tempo tenha preservado, de cada homem, a melhor parte.
Por fim, é possível que os escritos atribuídos a Aristóteles não fossem seus, mas, em grande parte, compilações de estudantes e seguidores que embalsamaram nas anotações que fizeram a substância sem artifícios de suas palestras. Parece que Aristóteles não publicou, enquanto vivo, quaisquer trabalhos técnicos, exceto os relativos à lógica e à retórica; e que a forma atual dos tratados de lógica se deve a uma editoria posterior. No caso da Metafísica e de Política, as notas deixadas por Aristóteles parecem ter sido reunidas pelos seus executores testamentários, sem revisões ou alterações. Até mesmo a unidade de estilo que destaca os escritos de Aristóteles e oferece um argumento para aqueles que defendem sua autoria comum por parte da Escola Peripatética. Quanto a isso, reina uma espécie de questão homérica, de alcance quase épico, na qual o leitor atarefado não irá querer entrar, e a qual um estudante modesto não procurará julgar. Em todo caso, podemos estar certos de que Aristóteles é o autor espiritual de todos esses livros que trazem seu nome: de que a mão poderá ser, em certos casos, de outra pessoa, mas a cabeça e o coração são seus. (O leitor que desejar um contato direto com o filósofo achará Meteorologia um interessante exemplo do trabalho científico de Aristóteles; obterá muitos conhecimentos práticos com a Retórica; e encontrará Aristóteles em sua melhor forma nos livros I-II de Ética e nos livros I-VV de Política. A melhor tradução inglesa da Ética é a de Welldon; de Política, de Jowett. Aristotle, de sir Alexandre Grant, é um livro simples; Aristotle, de Zeller, é erudita, mas seca; Greek Thinkers, de Gomprez [vol. IV] é magistral, mas difícil).
A História da Filosofia, de Will Durant
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