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FILOSOFIA ANALÍTICA - A análise lógica da linguagem

      Na virada do século XIX para o XX, surgiu uma corrente filosófica que, pela análise lógica da linguagem, procurava esclarecer o sentido das expressões (conceitos, enunciados, uso contextual) e seu uso no discurso linguístico. Por isso, ficou conhecida como filosofia analítica ou filosofia da linguagem.
      De acordo com essa corrente, muitos dos problemas filosóficos se reduziriam a equívocos mal-entendidos originados do uso ambíguo da linguagem.
      O desenvolvimento da filosofia analítica lançou luz sobre diversos aspectos da linguagem e influenciou filósofos de outros campos da filosofia, que passaram a atentar mais para o fenômeno da linguagem. Um dos filósofos contemporâneos que se vale dos resultados da filosofia analítica é Jurgen Habermas, pertencente à Escola de Frankfurt.
      O movimento da filosofia analítica passou por várias etapas, nas quais se voltou para questões específicas em relação à linguagem. Surgiu com o reconhecimento de que as questões sobre o sentido e a linguagem desempenham papel fundamental na filosofia.
      Essa preocupação teve como precursor o lógico e matemático alemão Johann Gottlob Frege (1848-1925). Percebendo que a linguagem comum contém expressões geradoras de equívocos, Frege propôs a constituição de uma linguagem formal que restringisse os inconvenientes e imprecisões da linguagem comum.
      Outros nomes importantes da filosofia analítica foram Bertrand Russell e Ludwig Wittgenstein, além dos britânicos John Langshaw Austin (1911-1960) e Gilbert Ryle (1900-1976).


Bertrand Russell
    Nascido no País de Gales (Grã-Bretanha), Bertrand Russell (1872-1970) dedicou-se à matemática, à lógica e à filosofia em geral. Escreveu mais de sessenta livros sobre temas como teoria do conhecimento, ciência, educação, política, lógica, matemática e história da filosofia. Participou ativamente das questões sociais de sua época, lutando em prol das liberdades democráticas, da educação, da emancipação feminina, da paz mundial. Foi uma das personalidades públicas mais influentes da Europa no século XX.

Além de matemático e filósofo, Russell foi um grande defensor das causas humanitárias, liderando campanhas pacifistas pelo desarmamento nuclear. Recebeu  Prêmio Nobel de Literatura, em 1950.


Desenvolvimento da filosofia analítica
    A contribuição filosófica mais reconhecida de Russell deu-se no campo da lógica matemática e da filosofia analítica, que dominou o cenário filosófico inglês durante o século XX. Em coautoria com Alfred North Whitehead, escreveu os três volumes de Principia Mathematica, publicados entre 1910 e 1913. Obra densa, rigorosamente técnica e dirigida a especialistas, é considerada por muitos estudiosos uma das mais importantes contribuições à lógica, desde os trabalhos de Aristóteles.
      A tese central de Principia Mathematica consiste em demonstrar que "toda a matemática pura advém dos princípios da lógica pura". Portanto, há uma identidade entre lógica e matemática. Posteriormente, Russell ampliou essa tese procurando estabelecer os fundamentos lógicos do conhecimento científico em geral. E, prosseguindo no projeto de apontar os pressupostos lógicos da racionalidade, desenvolveu a filosofia analítica submetendo a linguagem humana à análise lógica.


Erros de linguagem
    Para Russell, grande parte dos problemas filosóficos dissolvem-se em falsos problemas quando enfrentamos os equívocos, as ambiguidades e as imprecisões da linguagem cotidiana.
      O problema fundamental consistiria em investigar, em termos lógicos, as proposições linguísticas para saber o que estamos realmente falando quando questionamos ou afirmamos isto ou aquilo.
      A filosofia analítica promoveria uma espécie de "terapia linguística", desmontando as armadilhas ocultas da linguagem. Vejamos como Russell ilustra esse método analítico com um exemplo, embora ressalve que não aceite este argumento em particular:

"Acontece com frequência de alguém se perguntar quando tudo iniciou. O que deu partida ao mundo, de que início adquiriu o seu curso? Em vez de darmos uma resposta, examinemos primeiro a formulação da pergunta. A palavra central, na pergunta, é início. Como se emprega essa palavra no discurso corrente? Para responder a esta indagação secundária, precisamos examinar o tipo de situação em que ordinariamente usamos essa palavra. Talvez pudéssemos pensar num concerto sinfônico e dizer que o seu início será às oito horas. Antes do início, poderíamos jantar na cidade, e depois do concerto voltar para casa. O importante é observar que faz sentido perguntar o que aconteceu antes do início e o que ocorreu depois. Um início é um ponto no tempo, que marca uma fase de algo que acontece no tempo. Se retomarmos agora a questão filosófica fica claro que, neste caso, empregamos a palavra início de modo completamente diferente, porque não se pretende que jamais perguntássemos o que aconteceu antes do início de todas as coisas. Na verdade, explicando assim, podemos ver o que há de errado com a pergunta. Perguntar por um início sem nada que o preceda, é como perguntar por um quadrado redondo. Depois de compreendermos isso, deixaremos de fazer essa pergunta, porque compreenderemos que não tem sentido." (História do pensamento ocidental, p. 494-495.)


Ludwig Wittgenstein
    Ludwig Wittgenstein (1889-1951) nasceu em Viena, Áustria. Viveu na Inglaterra por um longo período e foi discípulo de Russell. Seu percurso filosófico pode ser dividido em duas grandes fases: a da análise lógica e a dos jogos de linguagem.


Análise lógica
    Na primeira fase, mais influenciada pelo pensamento de Russell e configurada no Tractatus logico-philosophicus, Wittgenstein itensificou a busca de uma estrutura lógica que pudesse dar conta do funcionamento da linguagem.
      Para o filósofo, a estrutura da linguagem deveria corresponder à realidade dos fatos. Em seus próprios termos, "a totalidade dos pensamentos verdadeiros é uma figura do mundo". Ou seja, a estrutura do mundo determinaria a estrutura da linguagem, quando esta é verdadeira.


Jogos de linguagem
    Em sua segunda fase, Wittgenstein deu um giro de 180° e afastou-se dessa compreensão de que a verdade da proposição deve ser verificada na experiência do mundo real. Passou a afirmar a impossibilidade de uma redução legítima entre um conceito lógico (da linguagem) e um conceito empírico (da realidade).
      Em outras palavras, a linguagem não seria a captura conceitual da realidade, isto é, não seria a reprodução do objeto, mas sim uma atividade, um jogo. E os jogos de linguagem adquirem seu significado no uso social, nos diferentes modos de ser e de viver no qual a fala está inserida. Desse modo, é a linguagem que passa a determinar, de certo modo, a concepção da realidade.
      De acordo com Wittgenstein, a linguagem comum possui uma riqueza de espécies e tipos de frases que são usadas em situações específicas (mandar, pedir, relatar, descrever, inventar, agradecer etc.) e formam os "jogos de linguagem", que se produzem socialmente e não individualmente.
      Com essa perspectiva, o filósofo abandonou a intenção de fazer da linguagem comum a "pintura da realidade", como ele mesmo havia dito anteriormente. O termo linguístico não poderia mais ser explicado por meio de uma análise lógica, mas apenas a partir de seu uso social.
      Na obra Investigações filosóficas, Wittgenstein compara a linguagem a uma caixa de ferramentas. Para ele, não se trata mais de considerá-la falsa ou verdadeira, mas de saber usá-la. Ou seja, a tarefa da filosofia é usar adequadamente a linguagem, conhecendo seus limites e calando-se diante do que não pode ser falado.

Para Wittgenstein, a linguagem é como uma caixa de ferramentas: pode ser usada em situações e contextos diversos, formando "jogos de linguagem" diferentes, como no discurso acadêmico e na gíria descontraída de um grupo de rappers.

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