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ESCOLA DE FRANKFURT - A teoria crítica contra a opressão

      Escola de Frankfurt é o nome dado ao grupo de pensadores alemães do Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt, fundado na década de 1920. Sua produção ficou conhecida como teoria crítica. Entre seus pensadores destacaram-se Theodor Adorno, Max Horkheimer, Walter Benjamin, Herbert Marcuse e Jurgen Habermas, além de Erich Fromm (1900-1980), psicanalista teuto-americano.
      Apesar de grandes diferenças de pensamento entre esses autores, identificamos neles a preocupação comum de estudar aspectos variados da vida social, de modo a compor uma teoria da sociedade como um todo. Para tanto, investigaram as relações existentes entre os campos da economia, da psicologia, da história e da antropologia.
      Os pontos de partida fundamentais de suas reflexões foram a teoria marxista (na verdade, uma leitura original do marxismo) e a teoria freudiana, que trouxe à tona elementos novos sobre o psiquismo das pessoas. Mas há também outras influências, como as de Hegel, Kant ou do sociólogo Max Weber.
      A Escola de Frankfurt concentrou seu interesse na análise da sociedade de massa, termo que busca caracterizar a sociedade atual, na qual o avanço tecnológico é colocado a serviço da reprodução da lógica capitalista, enfatizando o consumo e a diversão como formas de garantir o apaziguamento e a diluição dos problemas sociais.


Theodor Adorno e Max Horkheimer
    Na análise da sociedade de massa, que se desdobra em vários aspectos, um tema muito presente é a crítica da razão. De acordo com Max Horkheimer (1895-1973) e Theodor Adorno (1906-1969), a razão iluminista, que visava a emancipação dos indivíduos e o progresso social, terminou por levar a uma crescente dominação das pessoas, em virtude justamente do desenvolvimento tenológico-industrial.
      Horkheimer acreditava que o problema estava na própria razão controladora e instrumental, que busca sempre a dominação, tanto da natureza quanto do próprio ser humano. Assim escreveu ele em 1946, em Eclipse da razão:

"Parece que enquanto o conhecimento técnico expande o horizonte da atividade e do pensamento humano, a autonomia do homem enquanto indivíduo, a sua capacidade de opor resistência ao crescente mecanismo de manipulação de massas, o seu poder de imaginação e o seu juízo independente sofreram uma redução. O avanço dos recursos técnicos de informação se acompanha de um processo de desumanização." (p. 6).

      Em um texto de autoria conjunta com Adorno, A dialética do esclarecimento, de 1947, ambos fazem dura crítica ao Iluminismo, que estimulou o desenvolvimento dessa razão controladora e instrumental que predominou na sociedade contemporânea. Denunciam também o desencantamento do mundo, a deturpação das consciências individuais, a assimilação dos indivíduos ao sistema social dominante.
      Em resumo, Horkheimer e Adorno denunciam a morte da razão crítica, asfixiada pelas relações de produção capitalista. Se denúncias semelhantes já haviam sido feitas no campo do marxismo, o que há de característico nesses filósofos da Escola de Frankfurt é a desesperança em relação à possibilidade de transformação dessa realidade social.
      Essa desesperança se deveria ao diagnóstico da ausência de consciência revolucionária no proletariado, que teria sido assimilado, absorvido pelo sistema capitalista, seja pelas conquistas trabalhistas alcançadas, seja pela alienação de suas consciências, promovida pela indústria cultural.
      Indústria cultural é um termo difundido por Adorno e Horkheimer para designar a indústria da diversão de massa, veiculada pela televisão, cinema, rádio, revistas, jornais, músicas, propagandas etc. Através da indústria cultural e da diversão se obteria a homogeneização dos comportamentos, a massificação das pessoas.

A "indústria cultural" expõe seus produtos como qualquer outro bem de consumo. É a banalização comercial da cultura.
      A falta de perspectiva de transformação social levou Adorno a se refugiar na teoria estética, por entender que o campo da arte é o único reduto autêntico da razão emancipatória e da crítica à opressão social.


Walter Benjamin
    Walter Benjamin (1892-1940) distingue-se de Adorno e Horkheimer por uma postura mais otimista no que diz respeito à indústria cultural e à emancipação política. Em seu texto A obra de arte na época de suas técnicas de reprodução, ele se mostra esperançoso com a possibilidade de que a arte, a partir do desenvolvimento das técnicas de reprodução (discos, reprografia e processos semelhantes), torne-se acessível a todos.
      Enquanto, na visão de Adorno e Horkheimer, a cultura veiculada pelos meios de comunicação de massa não permite que as classes assalariadas assumam uma posição crítica em relação à realidade, Benjamin acredita que a arte dirigida às massas pode servir como instrumento de politização.

      Além disso, desenvolveu reflexões nas quais buscou conciliar a teoria marxista com a tradição judaica, dando origem a um pensamento que muitos consideram de difícil penetração, ainda que de grande beleza literária.


Herbert Marcuse
    Herbert Marcuse (1898-1979) desenvolveu uma obra marcada significativamente pelas teorias freudiana e marxista. Em eros e civilização, retomou o tema desenvolvido por Freud da necessidade de repressão dos instintos para a manutenção e o desenvolvimento da civilização.
      De acordo com Freud, a história social do ser humano é a história de sua repressão, do combate ao livre prazer em prol do trabalho, do adiamento do princípio do prazer para atender ao princípio da realidade. Sem essa renúncia, a vida social seria impossível.
      Marcuse dá razão ao diagnóstico de Freud, porém discorda do fundados da psicanálise em apresentar essa situação como algo eterno, ou seja, que é impossível uma civilização não repressiva. Para Marcuse, as imposições repressivas são antes produtos de uma organização histórico-social específica do que uma necessidade natural e eterna das sociedades.
      O filósofo apontou a possibilidade de uma civilização menos repressiva, surgida do próprio desenvolvimento tecnológico, que criaria condições para a libertação quanto à obrigação do trabalho e o consequente aumento do tempo livre. No entanto, isso não se dará, segundo Marcuse, sem a intervenção do ser humano para reorientar o rumo da trajetória histórica possibilitada por esse desenvolvimento.
      Nesse ponto, a tarefa da filosofia seria anunciar essa possibilidade. Se isso não ocorrer, teremos o contrário, ou seja, a perpetuação do desenvolvimento tecnocientífico a serviço da dominação e da homogeneização dos indivíduos. Tal situação criaria o que o próprio Marcuse chamou de homem unidimensional, incapaz de criticar a opressão e construir alternativas futuras.


Jürgen Habermas
    Dentre os teóricos da Escola de Frankfurt, o de maior influência atualmente é Jürgen Habermas (1929-). Em sua tese, ele discorda de Adorno e Horkheimer no que se refere aos conceitos centrais da análise realizada por esses dois filósofos: razão, verdade e democracia.
      Vimos que, de acordo com essa análise, Adorno e Horkheimer chegam a um impasse quanto à possibilidade de uma razão emancipatória, já que a razão estaria asfixiada pelo desenvolvimento do capitalismo.


Último racionalista
    De acordo com Habermas, essa é uma posição perigosa em filosofia, pois poderia conduzir a uma crítica radical da modernidade e, em consequência, da razão, que levaria ao irracionalismo.
      Em seu artigo "Modernidade versus pós-modernidade", ele enfatiza esse ponto, afirmando, contra a tendência ao irracionalismo presente na chamada filosofia pós-moderna, que "o projeto da modernidade ainda não foi cumprido". Ou seja, o potencial para a racionalização do mundo ainda não está esgotado. Por isso Habermas costuma ser descrito como "o último grande racionalista".
      O filósofo também discorda dos resultados pessimistas da análise de Adorno e Horkheimer segundo a qual a razão não mais se realizaria no mundo, porque o capitalismo, em sua complexidade, teria conseguido narcotizar a consciência do proletariado e, dessa forma, perpetuar-se como sistema.
      Para Habermas, existem alguns pontos falhos nessa avaliação, cuja identificação permitiria propor uma retomada do projeto emancipatório, porém em novas bases. Na realidade, o filósofo rompe com a teoria marxista em seus pontos fundamentais, tais como a centralidade do trabalho e a identificação do proletariado como agente da transformação social.

Habermas propõe um novo conceito de razão, a razão comunicativa, como forma de retomar o projeto emancipatório da humanidade em novas bases.


Ação comunicativa
    Habermas propõe então, como nova perspectiva, outro conceito de razão: a razão dialógica, que brota do diálogo e da argumentação entre os agentes interessados, em uma determinada situação. É a razão que surge da chamada ação comunicativa, do uso da linguagem como meio de conseguir o consenso. Para tanto, é necessária uma ação social que fortaleça as estruturas capazes de promover as condições de liberdade e de não constrangimento, imprescindíveis ao diálogo.


Verdade intersubjetiva
    O conceito de verdade também se modifica em função dessa nova perspectiva. Habermas propõe o entendimento da verdade não mais como uma adequação do pensamento à realidade, mas como fruto da ação comunicativa; não como verdade subjetiva, mas como verdade intersubjetiva (entre sujeitos diversos), que surge do diálogo entre os indivíduos. Nesse diálogo aplicam-se algumas regras, como a não contradição, a clareza de argumentação e a falta de constrangimentos de ordem social.
      Razão e verdade deixam, assim, de constituir conteúdos ou valores absolutos e passam a ser definidos consensualmente. E sua validade será tanto maior quanto melhores forem as condições nas quais se dê o diálogo, o que se consegue com o aperfeiçoamento da democracia.
      O pensamento de Habermas incorpora e desenvolve reflexões propostas pela filosofia da linguagem. A ênfase dada por ele à razão comunicativa pode ser entendida como uma maneira de tentar "salvar" a razão, que teria chegado a um beco sem saída. Assim, se o mundo contemporâneo é regido pela razão instrumental, conforme denunciaram os filósofos que o antecederam na Escola de Frankfurt, para Habermas caberia à razão comunicativa, enfim, o papel de resistir a e reorientar essa razão instrumental.
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