Pensar a vida e viver o pensamento, de forma profunda e radical. Isso é filosofar.

SÉCULO XX - Uma era de incertezas

      O século XX foi um período marcado por grandes convicções. De modo geral, muitos filósofos estavam confiantes no poder da razão, os cientistas, entusiasmados com o progresso tecnológico, os capitalistas, radiantes com as vantagens da expansão industrial, os românticos, vibrando com a valorização da pátria e dos sentimentos nacionais, os socialistas, pregando adorosamente a construção do socialismo, e assim por diante.
      Poucas dessas convicções subsistiram intactas no século XX, que foi, por isso, caracterizado como uma era de incertezas.

A era da incerteza é o título de um livro do economista canadense John Kenneth Galbraith que analisa e compara as grandes certezas do pensamento econômico do século XIX com as incertezas cm que os problemas foram enfrentados no século XIX.

      Isso começou a verificar-se logo na passagem do século XIX para o XX, quando Freud fundou a psicanálise e surgiram as psicologias do inconsciente, colocando dúvidas sobre a hegemonia da razão nos assuntos humanos.
      Quase paralelamente, Einstein formulou a teoria da relatividade e, algum tempo depois, Heisenberg enunciou o princípio da incerteza, lançando as bases de uma progressiva mudança de paradigmas na ciência. O incerto começava a ocupar o espírito do mundo contemporâneo a partir de seu baluarte: a ciência.


Mundo de contrastes
    E como definir os principais acontecimentos do século XX? Trágicos ou maravilhosos? gigantescos eles foram, sem dúvida.
      Duas guerras mundiais derramaram sangue em uma escala jamais vista na história da humanidade. A explosão da barbárie nazista aterrorizou o mundo. A Revolução Russa impulsionou a ascensão do socialismo em vários países, engatilhando o surgimento de uma guerra fria que polarizou grande parte do planeta e só terminou com o fim da União Soviética.
      Por outro lado, depois da Segunda Guerra, a tecnologia deu um salto vertiginoso. Telescópios hiper-potentes exploraram os confins do universo. Naves espaciais iniciaram a conquista do cosmo. A engenharia genética registrou avanços antes restritos aos livros de ficção. A tecnologia da informação e diversos novos aparatos chegaram à vida cotidiana de milhões de usuários em todo o mundo.
      Em contrapartida, a tecnologia trouxe também a corrida armamentista, o medo da destruição atômica e a degradação ambiental. E os avanços tecnológicos pouco contribuíram para diminuir as profundas desigualdades sociais no planeta. Calcula-se que 80% da renda mundial concentram-se nas mãos de 15% da população, enquanto mais da metade da humanidade ainda enfrenta problemas de desnutrição, falta de moradia, desamparo à saúde e à educação.

Campo de concentração nazista durante a Segunda Guerra Mundial. Infelizmente, não se pode dizer que esse tipo de perseguição contra diversas minorias tenha chegado ao fim. Ainda hoje, muitas populações são vítimas do preconceito e, eventualmente, de massacres.


Impressões antagônicas
    Por tudo isso, as impressões dos grandes intelectuais que viveram no século XX são díspares e, por vezes, antagônicas. Alguns o veem como uma época inédita pela vastidão dos dramas humanos, massacres e guerras. Uma estimativa das grandes violências do século XX menciona 187 milhões de mortes provocadas por decisão humana, o equivalente a mais de 10% da população mundial em 1900 (cf. Hobsbawm, Era dos extremos, p. 21).
      Outros pensadores reconhecem que, apesar das violências, o século XX foi também um período de progresso tecnocientífico e de importantes conquistas sociais, em que se destacaram, entre outras, a progressiva emancipação feminina. Se não tivesse havido — dizem alguns —, a população mundial não teria crescido mais de três vezes durante o século XX, pois saltou de, aproximadamente, 1,7 bilhão de pessoas em 1900 para cerca de 6 bilhões em 2000.


Respostas filosóficas
    Devido a essas contradições, desenvolveu-se no século XX — principalmente a partir de suas últimas três décadas — uma mentalidade menos arrogante quanto aos benefícios infalíveis da racionalidade científica. Percebeu-se que, destituídas de valores éticos, a ciência e a tecnologia nem sempre contribuem para o desenvolvimento humano. Em certos casos, prestam serviço à tirania e à barbárie.
      Isso se refletiu na produção das diversas correntes filosóficas surgidas nesse período, como o existencialismo, a Escola de Frankfurt e o pensamento pós-moderno.
      Assim, embora já estejamos no século XXI, com suas incertezas e contradições, o século XX não pode ainda ser fechado para balanço. Permanece aberto para quem quiser compreendê-lo.
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