Pensar a vida e viver o pensamento, de forma profunda e radical. Isso é filosofar.

FONTES PRIMEIRAS - Razão ou sensação?

      Vejamos agora outra questão básica enfrentada pela gnosiologia: qual é a fonte, o ponto de partida dos conhecimentos? De onde se originam as ideias, os conceitos, as representações?
      De acordo com as respostas dadas a esse problema, destacam-se basicamente duas correntes filosóficas: o racionalismo e o empirismo. Mas existe também uma terceira posição, o apriorismo kantiano, que conjuga essas duas correntes. Vejamos cada uma.


Racionalismo
    A palavra racionalismo deriva do latim ratio, que significa "razão", e é empregada em diversos sentidos. No contexto das teorias do conhecimento, racionalismo designa a doutrina que atribui exclusiva confiança à razão humana como instrumento capaz de conhecer a verdade. Como advertia um dos principais filósofos racionalistas, René Descartes (1956-1650), não devemos nos deixar persuadir senão pela evidência de nossa razão.
      Segundo os racionalistas, a experiência sensorial é uma fonte permanente de erros e confusões sobre a complexa realidade do mundo. Somente a razão humana, trabalhando com os princípios lógicos, pode atingir o conhecimento verdadeiro, capaz de ser universalmente aceito.
      Para o racionalismo, os princípios lógicos fundamentais seriam inatos, isto é, já estariam na mente do ser humano desde o nascimento. Daí a razão ser concebida como a fonte básica do conhecimento.


Empirismo
    A palavra empirismo tem sua origem no grego empeiria, que significa "experiência". As teorias empiristas defendem a tese de que todas as nossas ideias são provenientes da experiência e, em última instância, de nossas percepções sensoriais (visão, audição, tato, paladar, olfato).
      Um dos principais defensores do empirismo foi o filósofo inglês John Locke (1632-1704), que afirmava que nada vem à mente sem ter passado antes pelos sentidos.
      Locke entendia também que, ao nascermos, nossa mente é como um papel em branco (ou tábula rasa, expressão usada pelo pensador), desprovida de qualquer ideia.
      E de onde provém, então, o vasto conjunto de ideias que existe na mente humana? O filósofo responde: da experiência. A experiência, segundo Locke, supre o conhecimento por meio de duas operações:
• sensação, que leva para a mente as várias e distintas percepções das coisas, sendo, por isso, bastante dependente dos sentidos;

Para o empirista, todo conhecimento está baseado na experiência sensorial. Depende portanto, em última análise, de um ou mais dos cinco sentidos.

• reflexão, que consiste nas operações internas de nossa própria mente, desenvolvendo assim as ideias primeiras fornecidas pelos sentidos.

Nessas pinturas da catedral de Rouen (1892-1894), Claude Monet retrata não a catedral (a coisa em si, no dizer de Kant), mas a catedral tal como é apreendida pelo pintor com as variações de luz de um dia (o fenômeno).

"Afirmo que estas duas, a saber, as coisas materiais externas, como objeto da sensação, e as operações de nossas próprias mentes, como objeto da reflexão, são, a meu ver, os únicos dados originais dos quais as ideias derivam." (Locke, Ensaio acerca do entendimento humano, p. 160).


Apriorismo kantiano
    Nem todos os filósofos aderiram ao racionalismo ou ao empirismo. Alguns buscaram um meio-termo para essas visões tão opostas. É o caso do apriorismo kantiano, formulado pelo filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804).
      Kant afirmava que todo conhecimento começa com a experiência, mas que a experiência sozinha não nos dá conhecimento. Ou seja, é preciso um trabalho do sujeito para organizar os dados da experiência. Assim, o filósofo buscou saber como é o sujeito a priori, isto é, o sujeito antes de qualquer experiência, e concluiu que o ser humano possui certas faculdades ou estruturas (as quais ele denomina formas da sensibilidade e do entendimento) que possibilitam a experiência e determinam o conhecimento.
      Para Kant, portanto, a experiência forneceria a matéria do conhecimento (os seres do mundo), enquanto a razão organizaria essa matéria de acordo com suas formas próprias, com as estruturas existentes a priori no pensamento — daí o nome apriorismo kantiano.


"Penso, logo existo." Esse conhecimento a que chegou Descartes em suas Meditações está fundado na razão ou na experiência?
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