Pensar a vida e viver o pensamento, de forma profunda e radical. Isso é filosofar.

FILOSOFIAS HELENÍSTICAS - A busca da felicidade interior

      Com a conquista da Grécia pelos macedônicos (322 a.C.), teve início o chamado período helenístico. Devido à expansão militar do império macedônico, efetuada por Alexandre Magno, o período helenístico caracterizou-se por um processo de interação entre a cultura grega clássica e a cultura dos povos orientais conquistados.
      O mesmo processo se deu no campo filosófico. As escolas platônica (Academia) e aristotélica (Liceu) — dirigidas, respectivamente, pelos discípulos dos dois grandes mestres, Platão e Aristóteles — continuaram abertas e em plena atividade, mas os valores gregos começaram a mesclar-se com as mais diversas tradições culturais.

Entrada de Alexandre Magno na Babilônia. Alexandre foi um grande guerreiro e estrategista militar. Era macedônico, assim como seu mestre Aristóteles.


Do público ao privado
    No plano político, a antiga liberdade do cidadão grego, exercida no contexto de autonomia de suas cidades, foi desfigurada pelo domínio macedônico, ocorrendo um declínio da participação do cidadão nos destinos da pólis. Com isso, a reflexão política também se enfraqueceu.
      Substitui-se, assim, a vida pública pela vida privada como centro de reflexões filosóficas. Em outras palavras, as preocupações coletivas cedem lugar às preocupações pessoais.
      As principais correntes filosóficas desse período vão tratar da intimidade, da vida interior do ser humano. Formulam-se, então, diversos modelos de conduta, "artes de viver", "filosofias de vida".
      Parece que a principal preocupação dos filósofos era proporcionar às pessoas desorientadas e inseguras com a vida social alguma forma de paz de espírito, de felicidade interior em meio às atribulações da época. Um dos principais filósofos desse período, Epicuro, aconselhava que as pessoas se afastassem dos perigos e intranquilidade da vida política e buscassem a felicidade em sua vida privada. "Viva oculto", era um de seus mandamentos.
      Entre as novas tendências desse período, destacaremos o epicurismo, o pirronismo e o cinismo.


Epicurismo: o prazer
    O epicurismo é uma corrente filosófica fundada por Epicuro (341-271 a.C.), que defendia que o prazer é o princípio e o fim de uma vida feliz.
      No entanto, Epicuro distinguia dois grandes grupos de prazeres. O primeiro reúne os prazeres mais duradouros, que encantam o espírito, como a boa conversação, a contemplação das artes, a audição da música etc. O segundo inclui os prazeres mais imediatos, muitos dos quais são movidos pela explosão das paixões e que, ao final, podem resultar em dor e sofrimento.
      De acordo com o filósofo, para que possamos desfrutar os grandes prazeres exagerados da paixão, como os medos, os apegos, a cobiça, a inveja. Por isso, os epicuristas buscavam a ataraxia, isto é, o estado de ausência da dor, quietude, serenidade, e impertubabilidade da alma.

Observação: O epicurismo muitas vezes é confundido com um tipo de hedonismo marcado pela procura desenfreada dos prazeres mundanos. No entanto, o que Epicuro defendia era uma administração racional e equilibrada do prazer, evitando ceder aos desejos insaciáveis que, inevitavelmente, terminam em sofrimento.

Hedonismo — doutrina centrada na ideia de prazer (existem diversas doutrinas hedonistas).


Estoicismo: o dever
    O estoicismo, fundado a partir das ideias de Zenão de Cício (336-263 a.C.), foi a corrente filosófica de maior influência no período helenístico.
      Os representantes dessa escola, conhecidos como estoicos, defendiam a noção de que toda realidade existente é uma realidade racional, o que quer dizer que todos os seres, os indivíduos e a natureza fazem parte dessa realidade racional.
      O que chamamos de Deus, segundo esses pensadores, nada mais é do que a fonte dos princípios racionais que regem a realidade. Integrado à natureza, não existe para o ser humano nenhum outro lugar para ir ou fugir, além do próprio mundo em que vivemos. Somos deste mundo e, ao morrer, nos dissolvemos neste mundo.
      Não dispomos, portanto, de poderes para alterar, substancialmente, a ordem universal do mundo, mas, pela filosofia, podemos compreendê-la e viver segundo ela. Assim, em vez do prazer dos epicuristas, Zenão propõe o dever, vinculado à compreensão da ordem cósmica, como o melhor caminho para a felicidade. É feliz aquele que vive segundo sua própria natureza, a qual, por sua vez, integra a natureza do universo.
      Os estoicos também defendiam uma atitude de austeridade física e moral, baseada em virtudes como a resistência ante o sofrimento, a coragem ante o perigo, a indiferença ante as riquezas materiais. O ideal perseguido era um estado de plena serenidade (ataraxia) para lidar com os sobressaltos da existência, fundado na aceitação e compreensão dos "princípios universais" que regem toda a vida.


Pirronismo: a suspensão do juízo
    O pirronismo, fundado a partir das ideias de Pirro de Élida (365-275 a.C.), foi uma corrente filosófica que defendia a ideia de que tudo é incerto, nenhum conhecimento é seguro, qualquer argumento pode ser contestado.
      Por isso, seus seguidores propunham que as pessoas adotassem a suspensão do juízo (epokhé, em grego), isto é, a abstenção de fazer qualquer julgamento, já que a busca de uma verdade plena é inútil. Desse modo, aceitando que das coisas se podem conhecer apenas as aparências e desfrutando o imediato captado pelos sentidos, as pessoas viveriam felizes e em paz.
      O pirronismo constitui, portanto, uma forma de ceticismo, pois professa a impossibilidade do conhecimento, da obtenção da verdade absoluta.


Cinismo
    A palavra cinismo vem do grego kynicos, significa "como um cão". O termo cinismo designa, assim, a corrente dos filósofos que se propuseram viver como os cães da cidade, sem qualquer propriedade ou conforto.
      Levavam ao extremo a tese socrática de que o ser humano deve procurar conhecer a si mesmo e desprezar todos os bens materiais. Por isso, Diógenes de Sínope (c. 413-327) — o pensador mais destacado dessa escola — é conhecido como o "Sócrates demente", ou o "Sócrates louco", pois questionava os valores e as convenções sociais e procurava viver estritamente conforme os princípios que considerava moralmente corretos.
      Vivendo em uma época em que as conquistas de Alexandre promoveram o helenismo, mesclando culturas e populações, Diógenes também não tinha apreço pela diferença entre grego e estrangeiro. Conta-se que, quando lhe perguntaram qual era sua cidadania, teria respondido: "Sou cosmopolita" (palavra de origem grega que significa "cidadão do mundo").
      Há muitas histórias de sabedoria e humor sobre Diógenes. Uma delas conta que ele morava em um barril e que, certa vez, Alexandre Magno foi visitá-lo. De pé em frente à "casa", Alexandre perguntou-lhe se havia algo que ele, como imperador, poderia fazer em seu benefício, ao que Diógenes respondeu prontamente: "Sim, podes sair da frente do meu sol". Diz a lenda que Alexandre, impressionado com o desprezo do filósofo pelos bens materiais, teria comentado: "Se eu não fosse Alexandre, queria ser Diógenes".
      O artigo do quadro que segue desenvolve reflexões atuais a partir de outra história de Diógenes.



Período greco-romano
    O último período da filosofia antiga, conhecido como greco-romano, corresponde, em termos históricos, à fase de expansão militar de Roma (desde as Guerras Púnicas, iniciadas em 264 a.C., até a decadência do império romano, em fins do século V da era cristã). Trata-se de um período longo em anos, mas pouco notável no que diz respeito à originalidade das ideias filosóficas.
      Os principais pensadores desse período, como Sêneca, Cícero, Plotino e Plutarco, dedicaram-se muito mais à tarefa de assimilar e desenvolver as contribuições culturais herdadas principalmente da Grécia clássica do que de criar novos caminhos para a filosofia.
      A progressiva penetração do cristianismo no decadente império romano é uma das características fundamentais desse período. A difusão e a consolidação do cristianismo, pela Igreja Católica, atuaram na dissolução da força da filosofia grega clássica, que passou a ser qualificada de pagã (própria dos povos não cristãos).
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